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Dia Olímpico: a história dos voluntários, os grandes medalhistas de ouro dos bastidores


Neste 23 de junho é comemorado em todo o planeta o Dia Olímpico, data em que o Comitê Olímpico Internacional (COI) propaga os valores e ideais olímpicos com o mundo. Desde 1948 o COI e os Comitês Olímpicos Nacionais (CONs) celebram o dia promovendo a prática massiva do esporte. Embora os esportistas sejam os astros, o Dia Olímpico festeja, além do esporte e de seus atletas de alto rendimento, toda a estrutura para que o olimpismo seja propagado.

Para celebrar a data, o Surto Olímpico vai contar histórias de quem mostra que as grandes competições podem estar além de fenômenos como Michael Phelps ou Usain Bolt e ficar registradas para sempre na memória de quem não tem o glamour de uma estrela do esporte mundial: os voluntários.

"Dia Olímpico representa para mim um dia para celebrar nossa capacidade de nos unirmos através do esporte. Não apenas fisicamente, mas também academicamente. Um dia para celebrar o movimento olímpico e o que ele representa, mas também para discutir sua posição na sociedade atual", disse Ashley Ophorst, estudante de mestrado em Estudos Olímpicos e voluntária na Rio 2016

Acostumados a vivenciarmos medalhas, recordes, atletas fazendo o impossível e ganhando status de superatletas, é difícil imaginar que há gloria além das conquistas em quadras, pistas, campos, etc. Mas eles, os voluntários, mostram que não só há glória, como há esforço para fazer a festa olímpica acontecer com perfeição. Uma palavra que defina o voluntário olímpico?

"Talvez energia. Não só a energia de você ter energia, mas de passar a energia certa para desempenhar o seu melhor trabalho", disse Lais Baptista, biomédica e voluntária na Rio 2016. "Foi muito, muito, muito incrível. Você sente ali como você é importante, mesmo sendo apenas um voluntário em uma área específica, como todas as engrenagens precisam estar rodando de uma forma muito certa para tudo funcionar. Você realmente se sente parte disso tudo", completou.

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O voluntariado olímpico

"Meu carinho, de coração, para os incansáveis voluntários olímpicos. Com sorriso no rosto, eles fizeram os Jogos juntos. Sem eles não seria possível", exclamou Carlos Arthur Nuzman, presidente do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016 e então presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), no discurso de encerramento dos Jogos Olímpicos.

O discurso vibrante de Nuzman agradecendo aos voluntários é algo que fica gravado no pensamento de qualquer espectador daquele momento de encerramento dos Jogos do Rio de Janeiro. Entretanto, para entendermos a menção feita naquele Maracanã lotado, em 21 de agosto de 2016, é necessário voltarmos no tempo.

A história do voluntariado olímpico mostra que esses personagens sempre existiram nos Jogos Olímpicos da era moderna. Em 1912, na edição de Estocolmo, os voluntários eram principalmente escoteiros que auxiliavam em tarefas como entregas de mensagens, auxílio ao público e manutenção da ordem e segurança. As edições seguintes, antes da Segunda Guerra Mundial, também foram repletas de grupos de escoteiros praticando o serviço voluntário.

Nas décadas de 50 e 60, os voluntários passaram a ter mais funções, ficando mais ligados ao Comitê Organizador. O exército também passou a prestar serviço voluntário, principalmente em apoio logístico de cerimônias e eventos, como a preparação do local de competição. Atuaram também na segurança durante as edições entre 1968 e 1988, combatendo diversos protestos políticos .

O voluntariado olímpico que temos atualmente é bem próximo do que foi reconhecido de documentos olímpicos da edição dos Jogos Olímpicos de Verão de 1984, em Los Angeles. Com mais organização, cerca de 30.000 voluntários participaram da formação do evento.

Mas foi nos Jogos de Barcelona, em 1992, que o voluntariado olímpico virou uma febre. É bom lembrar que os Jogos também assumiram proporções de megaeventos, com muitos atletas e presença massiva da mídia. Neste cenário, os voluntários tornaram-se mais importantes na organização.

No Rio 2016, cerca de 50.000 voluntários foram registrados, trabalhando em diversas áreas, como receber o público, atender esportistas, auxiliar profissionais de mídia, produções de cerimônias, auxiliar presidentes e chefes de comitês, dentre outros.

A fábula olímpica dos voluntários

Era julho de 2016. A carioca Lais Baptista teve que programar suas férias do doutorado na Inglaterra para poder vivenciar um sonho: atuar como voluntária dos Jogos Olímpicos.

“Eu sempre gostei de assistir aos Jogos Olímpicos, principalmente por conta do vôlei e da natação que era o que eu mais gostava de assistir quando mais nova", comentando sua paixão desde pequena por esportes.

"Quando abriram as inscrições para Londres eu me candidatei, mas não fui selecionada. Nessa altura do campeonato eu já sabia que em 2016 seria no Rio e eu falei ‘no Rio não tem nem possibilidade de eu me inscrever e não ser selecionada (risos)’”.

Lais prestou serviços na Assistência à Família Olímpica, recepcionando e assistenciando membros, chefes e presidentes do COI e dos CONs. Mesmo sem ter atuado diretamente com atletas o tempo inteiro, a doutora em genética forense descreve como "emocionante" sua participação como voluntária na Rio 2016.

"Você sente muita pressão porque é a imagem do Comitê Organizador e do país nas suas mãos, mas ao mesmo tempo é muito emocionante ver tudo funcionando, tudo fluindo, com as pessoas se divertindo, e você sentir que fez parte disso”, comentou.

Juliana Amaral em seu último dia como voluntária na Rio 2016 - Foto: Arquivo Pessoal/Juliana Amaral

Juliana Amaral, 24, saiu de Maceió, no Alagoas, para também vivenciar a ambição dos Jogos Olímpicos Rio 2016. Ligada desde pequena ao esporte e mais recentemente como atleta universitária do vôlei, a jovem jornalista descreveu o que é ser voluntário e a sensação que sentiu.

"O voluntário é a peça chave para tudo acontecer. Sem voluntários não iria existir Olimpíadas. É um evento enorme em que cerca de 80% dele está em nossas mãos. É uma honra pra mim ter ajudado uma Olimpíada a acontecer e ver meus ídolos de perto", destacou.

"Muitas pessoas falaram: 'você é muito trouxa, você gastou dinheiro para não ganhar nada'. Eu falei: 'ganhar nada? Vocês não têm noção do que é estar lá, não têm noção do que é ser voluntário. Se um dia tiverem oportunidade vá e pare de ficar julgando as pessoas'. Até hoje, nunca mais eu vivi uma sensação como essa, foi o momento mais incrível da minha vida", disse a alagoana.

Voluntários olímpicos têm uma grande semelhança: a paixão pelos Jogos desde muito novo. É assim também com Ashley Ophorst, 27, neerlandesa de Waalwijk, que viu numa possível candidatura dos Países Baixos para sediar os Jogos Olímpicos de 2028, uma possibilidade de realizar seu sonho.

"Em 2012, os Países Baixos queriam se candidatar para sediar os Jogos Olímpicos de 2028. Esses Jogos seriam realizados exatamente 100 anos depois dos Jogos de 1928, que Amsterdã organizou. Eu, sendo fã das Olimpíadas desde os 8 anos de idade, disse a mim mesma que queria fazer parte desses Jogos como voluntária quando eles viessem para os Países Baixos. No final, eles decidiram não lançar uma candidatura para os Jogos de 2028. Como eu estava decepcionada, deixei o sonho ir. Embora, na verdade, eu não o abandonei", conta.

O sonho da jovem neerlandesa, na época com 19 anos, tinha ido embora momentaneamente, pois logo ela viu a possibilidade de estar no Rio, em um post nas redes sociais da página das Olimpíadas.

Como se fosse o próprio exemplo perfeito de "ideal olímpico" neste Dia Olímpico, Ashley Ophorst me contou de onde veio seu desejo de estar em uma Olimpíadas.

Em geral, fico feliz em poder ajudar outras pessoas de alguma forma. Os Jogos Olímpicos sempre me deram uma sensação especial. Ver atletas de todo o mundo dedicando a vida inteira para competir nos Jogos Olímpicos. Ver “os melhores dos melhores” em cada esporte competirem entre si, mas ainda mostrando um grande respeito pelos seus adversários, mesmo depois de uma derrota. Ser capaz de ajudar atletas, visitantes, jornalista ou qualquer outra parte envolvida nas Olimpíadas e fazer parte da atmosfera mágica dos Jogos Olímpicos é incrível

A reflexão olímpica

Ashley na Arena Carioca 1, onde foram disputadas os jogos de basquete na Rio 2016 - Foto: Arquivo Pessoal/Ashley Ophorst
A neerlandesa Ashley é mais do que voluntária olímpica. Ela estuda mestrado em Estudos Olímpicos, na Academia Olímpica Internacional (IOA), em parceria com a Universidade de Peloponesse com foco nos voluntários. Apesar de toda a magia de vivenciar o momento olímpico, como pesquisadora, ela entende que ser voluntário é muito mais do que apenas estar ali, enquanto os Jogos ocorrem.

"A palavra 'voluntário' não é mencionada nenhuma vez na Carta Olímpica. Eles [COI] não reconhecem a importância deles. Eles estão subestimando a importância e o poder dos voluntários na vida dos atletas antes, durante e após os Jogos Olímpicos. Voluntários olímpicos geralmente continuam sendo voluntários após os Jogos em suas próprias comunidades, inspirando novos voluntários. Quando o COI apoia este grupo, será uma situação em que todos saem ganhando. Os voluntários podem ajudar suas comunidades, e o COI tem mais maneiras de promover os Valores Olímpicos".

A pesquisadora cita a Carta Olímpica, o documento oficial do COI que registra os valores e ideais olímpicos. Nela, todos os protocolos olímpicos são relatados, incluindo o polêmico item 50, que proíbe protestos políticos, sociais e raciais. No entanto, o fato dos voluntários não serem citados pelo COI na Carta apresenta uma falha do Comitê com quem tanto contribui para o show.

"Colocar os voluntários na Carta Olímpica talvez não mude nada. Ainda assim, isso mostraria que o COI reconhece a importância dos voluntários e o papel que desempenham não apenas nos Jogos Olímpicos, mas também na vida dos atletas", complementa Ashley, acreditando ser uma "oportunidade perdida" por parte do COI.

Voluntária fazendo "coração" para fotógrafo na Rio 2016 - Foto: Kai Pfaffenbach/Reuters

Quando as entrevistas iam chegando ao fim a pergunta era sempre a mesma: "você voltaria a ser voluntária olímpica?". As respostas, sempre com histórias maravilhosas, também foram em sintonia, interligadas, como as engrenagens de uma estrutura de evento olímpico.

"A gente acaba querendo virar voluntário olímpico profissional", brincou aos risos a biomédica Lais Baptista.

"O meu plano de vida, depois de ter vivido a Rio 2016, é justamente participar de todas as Olimpíadas até eu morrer ou achar que não dá mais para mim. Com certeza eu seria voluntária novamente. Me inscrevi para Tóquio, mas recebi uma carta dizendo ser necessário ter o idioma japonês básico. Isso me decepcionou, mas coloquei como meta participar como espectadora e estou juntando dinheiro para isso. Eu respiro esporte, é o que eu quero para minha vida. Paris 2024 e Los Angeles 2028 que me esperem (risos)", brincou Juliana Amaral.

"Eu fui escolhida para ser voluntária em Tóquio 2020 na arena de competição da esgrima. Eu ainda penso em ir no próximo ano", disse Ashley antes de definir os voluntários. "Apaixonados. Os voluntários são apaixonados por uma causa. Isso vale para todos os voluntários que eu conheço. Não apenas no esporte, mas também nas escolas, serviços de saúde e muito mais."

A festa dos voluntários após a conquista do ouro brasileiro no vôlei masculino - Foto: Arquivo Pessoal/Juliana Amaral

"Fico muito nostálgica em relembrar o Dia Olímpico e saber que estou presente e marcada de alguma forma. Tenho tanta história que nem cabe em uma entrevista", brincou Juliana Amaral. "Nunca deixem de realizar seus sonhos", concluiu.

Apaixonados relembrando o amor pelo esporte e Jogos Olímpicos e com "energia" para propagar suas aventuras, os voluntários expuseram a humanidade presente em uma pessoa altruísta. Mais do que isso, eles mostraram que o jornalismo, assim como os valores e ideais olímpicos propagados neste Dia Olímpico, é feito de histórias repletas de sonhos.

Foto: Arquivo Pessoal/Juliana Amaral

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