Em um curto espaço de tempo, dois tenistas jovens, campeões de Grand Slam, estiveram nos holofotes dos principais sites esportivos, não por conta de suas conquistas e sim por assumirem que estão com depressão: Dominic Thiem e Osaka Naomi. E esses casos levantam uma questão ainda maior. Como cuidar desses atletas?
Para entender melhor esses casos, ouvi a psicóloga e jornalista Katia Rubio, que entre outras coisas, explicou detalhadamente o impacto de um diagnóstico de depressão na vida de um atleta e os sentimentos causados enquanto se lida com isso. Confira suas observações no texto e nos vídeos.
“Depressão pode ser considerada como uma patologia, como uma doença mental. E elas se diferem de doenças físicas, por não terem uma concretude no sintoma. Se você tem uma distensão muscular, uma ressonância magnética vai te mostrar que tipo de lesão aconteceu. Mas as doenças mentais são invisíveis. Só que não são indolores. A dificuldade de compreender a doença mental, leva a uma desqualificação não só do sintoma, como de todas as reações que a pessoa doente acusa”.
E vocês sabiam que existem profissionais que podem ajudar em questões como casos de depressão ou ansiedade? Rubio ressaltou a importância dos psicólogos e psiquiatras, que precisam cada vez mais estar inseridos no meio esportivo, para auxiliar os atletas. De quebra, ela ainda declarou que a crescente pressão do mercado e dos ricos contratos, podem causar ainda mais problemas aos esportistas.
Esses profissionais são fundamentais no meio esportivo. A incidência de doenças mentais em atletas cresce cada vez mais. E cresce junto com todas as responsabilidades que os contratos comerciais depositam nos esportistas. Uma atleta visível como a Osaka, não é só uma pessoa que entra em quadra para jogar. Ela carrega contratos milionários, carrega a responsabilidade da equipe, ela é um produto. E nesta condição, ela está no mercado, que é cruel. Se você não vende, você sai da prateleira.
Mas com um bom tratamento acompanhado por profissionais especializados, paciência e apoio de amigos e familiares, é possível vencer a depressão e ansiedade. Esse é o caso do tenista brasileiro Marcelo Zormann, campeão júnior das duplas em Wimbledon e medalhista de ouro nos Jogos Olímpicos da Juventude de Nanquim 2014, também nas duplas.
Foto: João Pires/Fotojump |
De volta ao circuito após ficar aproximadamente três anos afastado, devido o diagnóstico de depressão, Zormann afirmou que está mais maduro e encara a vida no esporte de forma diferente.
“A terapia, todo o tratamento que fiz contra depressão e ansiedade, me trouxeram um autoconhecimento, uma capacidade de enxergar e lidar melhor com as coisas. Ganhei entendimento do motivo das coisas terem acontecido daquela forma e hoje sou mais paciente com tudo”, revelou o atleta, dono de três títulos ITF Future em simples e outros 15 nas duplas.
O primeiro passo para conseguir melhorar e começar a preservar sua saúde mental, é assumir a doença e buscar ajuda com especialistas, assim como deveria ser feito com outras doenças. E durante o bate-papo com Zormann, ele explica muito bem isso.
“Tentei encarar como se fosse uma lesão física. Como se eu tivesse rompido um ligamento e precisasse de uma cirurgia. Então levei mais para este lado e comecei a fazer o que era necessário. Numa lesão você precisa sair de quadra e fazer fisioterapia. Eu fiz isso, mas visando a parte mental. E o tênis é um jogo mental, então as coisas não corriam bem. Não só dentro da quadra, mas também fora dela”,
Animado com os desafios da retomada de sua carreira, Zormann falou sobre o aprendizado do período fora das quadras.
Depois do que aconteceu, eu entendi que esse é um tema importante é que deve ser divulgado. Muita gente acha que contar com o apoio de um psicólogo ou psiquiatra é coisa de maluco, mas na realidade não. É algo muito bom e eu recomendo para qualquer pessoa, independentemente de você estar mal ou não. Porque isso é sobre autoconhecimento.
O que aconteceu com Thiem e Osaka?
O caminho percorrido por esses tenistas citados no início do texto, até o momento em que eles assumem o que está acontecendo, é um pouco diferente. Thiem venceu o US Open de 2020 e ainda conseguiu manter um bom nível de tênis até o fim daquela conturbada temporada, marcada pela paralisação causada pela pandemia de coronavírus.
Mesmo com os bons resultados, o austríaco já sentia os efeitos negativos de precisar ficar em bolhas e disputar torneios sem público. O agravamento da situação surgiu na pré-temporada, quando ele se viu num “buraco” após ter alcançado o seu grande objetivo, que era vencer um Grand Slam, como mencionou ao jornal austríaco Der Standard.
Thiem está ativo no circuito e apesar dos resultados negativos, disputou os últimos torneios mais importantes, como Roland Garros e eventos Masters 1000.
Osaka tem uma outra história. O primeiro grande momento de sua carreira ocorreu em meio a uma briga. Na decisão do título no US Open de 2018, Serena Williams, adversária da japonesa na final, teve um grande desentendimento com o árbitro de cadeira Carlos Ramos. O resultado da partida rendeu o caneco para Osaka, que demonstrava muito constrangimento com a situação, mesmo sagrando-se campeã.
Foto: Reprodução/ESPN |
Depois do episódio, Osaka ainda ganhou outros três Majors, (mais um US Open e dois Australian Open). O que ninguém imaginava é que as circunstâncias vividas naquela final causaram sequelas na japonesa, que alegou recentemente sofrer com “longos períodos de depressão”.
A situação só veio à tona, depois da tenista declarar que não daria entrevistas coletivas após suas partidas em Roland Garros. Sem saber como lidar com a situação, Osaka a princípio não deixou claro o motivo de sua decisão. Após os organizadores dos Grand Slams ameaçarem a atleta com punições mais severas, a japonesa abandonou o Major parisiense e assumiu que tem depressão e ansiedade.
Uma das favoritas ao ouro nos Jogos Olímpicos de Tóquio, onde joga em casa, Osaka decidiu passar mais um tempo com família e amigos, para se sentir melhor após tantos problemas. Ela não disputará o Torneio de Wimbledon nesta temporada, mas já confirmou sua presença no megaevento poliesportivo em seu país.
Ao ver críticas sobre a forma como Osaka lidou com a questão das entrevistas coletivas, Rubio avaliou a forma como a organização de Roland Garros tratou a decisão da atleta. Além disso, a psicóloga fez um alerta: “sem atleta, não há esporte”. Veja no vídeo abaixo.
Arte: Surto Olímpico
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