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"Se tiver com medo, vai com medo mesmo": Capitã da seleção relembra trajetória do título mundial no handebol em 2013


Cinara Piccolo/ Photo & Grafia/CBhb


22 de dezembro de 2013 é um dia histórico para o esporte brasileiro. Dez anos atrás, a seleção de handebol feminino enfrentava a Sérvia na decisão do mundial, encarou 19 mil pessoas no ginásio Belgrado Arena - já que as sérvias sediavam a competição - e conquistaram uma vitória épica por 22 a 20, conquistando um título inédito.

E para relembrar esta conquista histórica,  fizemos entrevistas especiais com alguns nomes presentes daquela conquista. A primeira é a capitã daquele time, Fabiana Diniz, ou  como era conhecida, Dara, que foi um dos grandes nomes do Brasil, sendo uma das âncoras defensivas da seleção e que teve a honra de levantar a taça de campeão mundial.

Dara, que atualmente é empresária, dona de pousada e mãe do Noah - como a mãe coruja, deixou bem frisado na conversa- contou que apesar do final feliz daquela caminhada, o clima era de tensão antes do mundial, por conta das duas derrotas doloridas nas quartas de final do mundial de 2011 contra Espanha - levando gol nos últimos segundos - e contra Noruega na Olimpíada de Londres - após levar a virada no segundo tempo:

"O clima era, vamos dizer assim, tenso, para ser bem sincera. A gente vinha de um Mundial em casa, as Olimpíadas e ter ficado nas quartas nas duas , fez o time vir com muita confiança e muita atenção ao mesmo tempo. " disse Dara, que explicou o trabalho que todo grupo fez para concretizar um bom resultado: "A gente sabia que a gente podia fazer algo muito grande, era até uma coisa que a gente interiorizou muito isso, ficou muito dentro do grupo essa questão da nossa capacidade de poder fazer algo muito grande, algo que talvez ninguém esperasse até então, E era aquela coisa, ansiedade, tensão, responsabilidade, confiança, era uma mistura ali de sentimento, mas o que mais prevalecia mesmo foi a união que esse grupo mostrou durante toda a preparação para esse Mundial. Foi um diferencial muito grande"


Agência EFE

O roteiro da primeira fase das outras competições se repetiu na Sérvia, com o Brasil terminando em primeiro no grupo com cinco vitórias em cinco jogos, superando Japão, China, Argélia, Sérvia e Dinamarca: E segundo Dara, isso, ligou um sinal de alerta no grupo, mas que acabou sendo usado de forma positiva

"Se eu falar pra você que o medo não existia, eu tô mentindo, né? Mas se tem uma frase que acompanhou esse grupo, que a Duda usava muito, a Mayara usava muito, em momentos assim, até de brincadeira:  "Se tiver com medo, vai com medo mesmo." E acabou se tornando um slogan de alguns momentos do jogo, ou de momentos antes do jogo. Enfim, tá com medo? Vai com medo mesmo, sabe? Então, não falar pra você que existia esse sentimento, esse receio de mais uma vez bater na trave, claro que ele existia. Mas ao mesmo tempo, a gente sabia que essas duas derrotas anteriores, prepararam esse grupo pra ganhar no momento certo. "

E após a vitória nas oitavas de final contra os Países Baixos, veio a temida quartas de final. Desta vez, o adversário foi contra a Hungria e foi um jogo dramático, com duas prorrogações, mas que acabou com o final feliz, Brasil 33 a 31. Para Dara, aquele jogo foi uma decisão mais intensa do que a própria decisão do título:


"O jogo, para mim, no momento que acabou, eu abracei o Morten (Soubak, técnico da seleção em 2013) e falei "cara, é nosso! é nosso!". Para mim aquela ali foi a final, não é menosprezando a Sérvia, nem menosprezando a final, nem os adversários que a gente enfrentou no torneio, mas aquele jogo da Hungria tinha um peso muito grande, tinha o fantasma de 2011, tinha o fantasma da Olimpíada, tinha toda a maturidade que o grupo tinha adquirido, todo o aprendizado, tudo que a gente tinha vivido, 2013 foi um ano bem difícil, individualmente para muitas jogadoras, problemas pessoais, enfim, e a gente acabou reunindo forças, se ajudando e somando forças para romper essas quartas de final, e foi um jogo, para mim, digno de uma final. Eu acho que se entregassem a medalha de campeão para o Brasil ali não seria ruim, não."

Dara também destacou a força daquele grupo, que foi fundamental para que a seleção passasse para a semifinal naquele que foi o segundo jogo da vida da capitã:  "Obviamente tivemos a Babi (Arenhart) brilhando, Ana Paula brilhando, Alexandra (Nascimento) brilhando, Duda (Amorim) brilhando... Eu já te falei vários nomes e todas brilharam, todas tiveram seus momentos de glória, seus jogos de glória no campeonato. E isso contribuiu muito para o grupo. Mayssa brilhou, Dani Piedade brilhou, enfim, eu brilhei... Então isso contribuiu na somatória de tudo, isso contribuiu para o grupo, para o resultado final. Então aquele jogo para mim, tirando a final sem dúvida, foi o jogo da minha vida." 

E após esse confronto épico contra a Hungria, uma semifinal até certo ponto tranquila contra a Dinamarca levou o Brasil para a decisão contra a Sérvia. E em um trabalho de blindagem exterior, a equipe se preparou para ignorar as mais de 19 mil pessoas presentes torcendo pelo título inédito das sérvias, tanto que elas ignoraram até o Novak Djokovic no telão antes do jogo:

"A gente estava no corredor para entrar, e no telão de cima do marcador, apareceu um vídeo do Djokovic falando para as meninas da Sérvia e tudo mais, mas enfim, aquilo para a gente foi bem sem muito significado, porque a gente não entendeu nada, ele falou em sérvio. Então, para a gente, assim, teve zero significado (risos) Até hoje eu não sei o que ele falou para elas. Mas, enfim, também não importou muito. Não impôs nada para a gente, não modificou nada na nossa cabeça."

Dara fez questão todo o trabalho psicológico da comissão técnica para aquele mundial, o que foi um dos fatores que ajudaram as meninas a fazerem seu jogo sem se importar com a torcida adversária, além de elogiar os bravos brasileiros que pintaram por lá para torcer: "A gente conseguiu se blindar de muitas coisas exteriores, a gente conseguiu se blindar de uma pressão, a gente conseguiu se blindar de fantasmas, de derrotas, de problemas. Então, ali, o ginásio lotado em si, era o de menos diante de tudo que a gente já tinha passado pra chegar até ali. Então, a torcida toda contra, o ginásio lotado, não deixa de ser uma coisa normal quando se joga competições desse nível." frisou Dara, que também falou da importância dos poucos e bravos brasileiros que foram lá torcer por elas:


Dara em ação na final contra a Sérvia (foto: Cinara Picolo/Phot e Grafia/CBHb)

"Então, a gente tentou usar tudo a nosso favor. a gente viu uns pontinhos verdes que torceram por nós lá, que foram os Chapolins, uma galera que seguia a gente, Larissa do ZN Handebol, e tiveram alguns brasileiros moradores de Belgrado também, ficaram sabendo da final e acabaram comparecendo. Então tinha um polozinho verde no meio daquele mundo de Sérvios, e que foi o nosso ponto de referência na hora de vibrar, a gente pensava 'vamos vibrar com eles e para eles, que era ali representando o nosso Brasilzão'. "

 E a confiança de Dara tava tão alta naquele dia, que ela afirma ter sentido em vários momentos que a vitória seria do Brasil e cita um lance especial, que aconteceu nos minutos finais da decisão: "Foi um lance de um passe para a Dani Piedade, não sei se é um erro de passe, enfim, é um erro de passe e a bola não chega na mão da Dani e ela volta que nem um foguete, pressionando a menina sem tocar, mas pressionando. E vai tentando pressionar, pressionar, pressionar e a Mayssa faz uma defesa assim extraordinária. É extraordinário. Ali, depois daquela recuperação da Dani correndo e da defesa da Mayssa, ali, para mim, ninguém tirava o título do Brasil Mais. Ali eu tinha mais do que certeza que a gente ia ser campeã."


E quando o juiz apitou o fim do jogo? Dara tentou por em palavras aqueles sentimentos após a confirmação da conquista: "Infelizmente, nessa vida de atleta a gente mais perde do que ganha, mas quando a gente ganha, parece que a gente tirou um peso de cima e era alegria, satisfação, honra, uma mistura de sentimentos mesmo, de caramba, a gente fez para merecer, é merecido, todo mundo que está aqui merece, o brasileiro inteiro merece, o Handebol brasileiro merece, minha família merece, enfim. Não dá nem para te explicar, eu estou te falando um monte de coisa aqui e posso te falar milhões de palavras aqui e eu não vou conseguir explicar exatamente o que comemorar, eu não sabia se eu pulava. Eu sentava, se abraçava uma, se abraçava a outra, eu saí meio correndo, fiquei meio perdida, depois, vendo os vídeos, eu não encontrava ninguém para abraçar e estava todo mundo na minha frente, uma no chão, enfim, uma loucura, sem palavras."


Perguntada sobre qual o segredo daquele grupo para ter conquistado esse título mundial, Dara destacou uma palavra: resiliência

"Naquele grupo tinha gente experiente, tinha gente nova, gente nem tão experiente e nem tão nova e foi uma mistura perfeita, eu acho que era um grupo muito resiliente. Um grupo que soube usar os maiores pontos fortes que a gente tinha, um grupo que usou muito da humildade, pra abrir mão até de algumas coisas, em prol de uma conquista comum, que era o que a gente queria. Mas se eu tivesse que definir esse grupo de 2013 campeão do mundo, eu diria que foi um grupo muito resiliente e um grupo que tinha muita vontade de fazer algo assim incrível."

 Por fim, Dara, destacou o feito histórico que esse grupo fez e que ficou marcado para sempre, mas espera um dia ver mais do handebol brasileiro: "Aquela geração fez história na modalidade e não só a nivel nacional, mas também no nível mundial. O ano de 2013 vai ser sempre marcado no mundo 'handebolístico' como o ano do título mundial do Brasil. Eu me sinto muito grata por ter feito parte disso, de ter levantado esse troféu. E espero que o Brasil possa conquistar outros mais no futuro"




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