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Coluna Coelho Olímpico: 2024 é o ano em que sonhamos muito no esporte, mas a realidade também foi um despertar feliz

Coluna Coelho Olímpico: 2024 é o ano em que sonhamos muito no esporte, mas a realidade também foi um despertar feliz
Foto: Angelika Warmuth/Reuters


2024 é o ano em que o esporte brasileiro sonhou como nunca. Sim, até mais do que na Olimpíada em casa. Se ali em 2016 batia um medo justificável sobre o sucesso do evento em termos de organização, o que depois se comprovou um receio desnecessário, dessa vez praticamente todos os olhos estavam direcionados por aqui unicamente para o desempenho esportivo. Sonhamos tanto que beiramos a utopia. Vá lá, natural depois de duas campanhas recordistas consecutivas. Mas o despertar mostrou que uma realidade modesta também pode ser devidamente desfrutada, mesmo com os percalços que merecem ser citados e refletidos. 

No maior de nossos esportes, ficamos de fora da disputa em que o tricampeonato olímpico consecutivo poderia ser buscado. Um vexame na classificação continental dos comandados de Ramon Menezes deixou o país ausente da disputa no futebol masculino. O maior dos desastres esportivos da Seleção num ano de queda precoce na Copa América e de tabus negativos rompidos nas Eliminatórias. O pior dos cenários no ano em que perdemos Zagallo, o maior dos campeões com a amarelinha. 

No vôlei, os homens até chegaram em Paris. Para uma derrota vexaminosa no primeiro jogo de mata-mata no torneio olímpico, script repetido do filme da Liga das Nações. Entre os clubes, restou ao Cruzeiro a conquista do Mundial como alento. No futebol, nem isso. O Botafogo, campeão nacional e continental, não passou das quartas na Copa Intercontinental. Já o Flamengo até levou o torneio mundial em sua versão sub-20. E o Corinthians, campeão do Brasil e da América do Sul no futebol feminino, será que teria levado uma edição entre as mulheres? Não saberemos, pois a Fifa inexplicavelmente ainda não organiza o torneio.

Foto: Alex Caparros/Fifa


No universo expandido de Gianni Infantino, encontramos também alegrias. O Brasil encontrou o caminho do hexacampeonato na areia e na quadra. Respectivamente 6 a 4 em Dubai contra a Itália e 2 a 1 contra a Argentina em Tashkent, no Uzbequistão. Se o domínio de outrora nas modalidades é irreal, reaprender a vencer é essencial. E ganhar dos nossos vizinhos, vocês bem sabem, é muito melhor. Também veio da Fifa o reconhecimento individual ao melhor jogador do futebol na temporada, com o The Best entregue ao craque Vinícius Júnior, autor de gols nas finais da Liga dos Campeões da Europa e da Copa Intercontinental com o Real Madrid. 

Em Paris, o futebol nos fez sonhar com as mulheres. As anfitriãs ficaram pelo caminho, as campeãs mundiais também… Mas no meio do caminho encontramos as americanas. E encontramos as americanas no meio do caminho também no vôlei feminino. Prata e bronze foram o limite para nossos melhores times olímpicos.

Mas os Estados Unidos, que lideraram o quadro geral no sufoco por causa do triunfo de suas mulheres também no basquete, não foram nosso único fantasma francês. O posto voltou a estar nas mãos do Japão desde a nossa primeira medalha, uma prata conquistada no judô por Willian Lima. O judoca teve a primazia de puxar a fila das conquistas por poucos minutos. Logo depois, a sua colega de modalidade Larissa Pimenta levou um bronze. E a skatista Rayssa Leal também foi ao pódio em terceiro lugar na mesma insana sequência daquela tarde de domingo. Na frente dela, adivinhem, duas japonesas. Diante das circunstâncias da classificação de horas antes e da própria prova, a nova ida ao pódio mereceu muita celebração. 

Foto:SLS


A mais jovem brasileira a conquistar medalhas em duas edições olímpicas se viu diante do esquadrão nipônico também na decisão do Mundial da World Skate, em Roma. Era a única representante de qualquer outro país que não tenha o iene como moeda na finalíssima. E foi a campeã! Não foi o único título global de Rayssa, que se tornou ainda tri da SLS em São Paulo, novamente com a emoção reinando até a última nota. 

E não foi a única conquista mundial brasileira no skate. No park, o Brasil pode dizer que fez dobradinhas em vários sentidos. Entre os homens, ouro para Augusto Akio e prata para Pedro Barros - numa modalidade em que Luigi Cini lidera o ranking da temporada, dimensionando o nível dos brasileiros. Entre os gêneros, título também para Raicca Ventura no feminino. No vertical, Akio foi prata e Gui Khury foi o campeão. 

Foto: Julio Detefon/CBSk


Semanas antes do Mundial, Japinha e Raicca haviam estado no Palácio do Planalto para uma recepção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva aos atletas olímpicos. Ele, com contornos emocionantes, foi medalhista de bronze em Paris. Mas bem que podia ter sido pelo menos prata. Ah, os juízes… A mesma percepção de que faltou boa vontade para que as notas refletissem o talento nacional pode ser estendida também para o surfe, em que Tatiana Weston Webb ficou com o segundo lugar numa campanha histórica. Conquistas essenciais para que o skate não se resuma ao street e o surfe não se resuma aos homens na visão média do Brasil. 

Foto:COB

Já para Gabriel Medina, o problema foi mais sério do que com os juízes. As contas a acertar agora são com Netuno. Mais brilhante nome da sua geração, o surfista viu as ondas cessarem em Teahupo'o logo na sua bateria semifinal. Restou buscar - e conquistar - o bronze. Ufa! A história da sua campanha pode chegar em Los Angeles também de outro modo, movendo a organização do surfe para piscinas com ondas artificiais.

A medalha do surfista foi um degrau compartilhado com outros nomes importantes da campanha brasileira, como o corredor Alison dos Santos e a boxeadora Bia Ferreira, única medalhista de sua modalidade, numa das surpresas negativas do Time Brasil. Mas para mostrar como tudo é uma questão de perspectiva, o bronze igualmente isolado de Edival Pontes no taekwondo mereceu festejos. 

Foto: Reprodução

Porém o recorte bronzeado merece atenção especial para as conquistas das equipes no judô e na ginástica. Se as notas podem ser controversas, reiteramos aqui a nossa mais absoluta confiança na lisura do sorteio que colocou Rafaela Silva para fazer o desempate contra a Itália! Quando o telão apontou o peso de sua categoria, a medalha já estava praticamente chegando no pescoço dela e dos colegas de equipe, incluindo medalhistas em edições anteriores, como Daniel Cargnin, Ketleyn Quadros e Rafael Silva. 

Na ginástica, o pódio foi uma escala inédita para Flávia Saraiva, Jade Barbosa, Júlia Soares e Lorrane dos Santos. A terceira equipe mais completa do mundo é nossa, marcando o ápice de uma evolução de gerações. E a segunda ginasta mais completa do mundo? Também é nossa. Rebeca Andrade foi prata no individual geral, mesma medalha conquistada no salto. E aqui vamos dar um salto no tempo e na coesão do texto, pois o capítulo mais arrebatador da nossa maior atleta olímpica de todos os tempos merece fechar esse resumo.

Foto: Wander Roberto/CPB


Que tal dar um pulo também cronológico de umas semanas até a Paralimpíada? Na competição, o Brasil finalmente encontrou o rumo das batidas na frente nas piscinas parisienses. E como fez isso! Gabrielzinho se tornou uma estrela não apenas no Brasil, mas também no país anfitrião. Amassou os rivais e se tornou o atleta masculino brasileiro mais relevante do ano entre todas as modalidades, incluindo as olímpicas. Sobrou nas provas ao ponto de não tornar esse apontamento controverso mesmo quando lembramos das pratas suadas e brilhantes de Caio Bonfim e Isaquias Queiroz.

Os Jogos Paralímpicos também nos deram uma nova recordista entre as mulheres. Também nadadora, Carol Santiago possui mais ouros do que qualquer outra competidora brasileira. Mas a festa nacional não se restringiu na água! No atletismo, Beth Gomes levou o ouro com um recorde paralímpico no arremesso de peso. Na corrida dos 1500m, o recorde que acompanhou o ouro de Yeltsin Jacques foi mundial. O topo do pódio também veio no halterofilismo, na canoagem, no taekwondo… E no judô, com Arthur Silva, Alana Maldonado, Willians Araújo e Rebeca Silva.

Foto: Alexandre Loureiro/COB


Ah, o judô… Vamos precisar retomar ele mais uma vez! E pelo melhor dos motivos! Num dia montado para uma glória francesa, incluindo a presença do presidente Emmanuel Macron, Romane Dicko caiu na semifinal para a nossa Bia Souza. A partir daí, a energia dela e do país fez com que a israelense Raz Hershko parecesse um mero protocolo na decisão. Depois do topo do pódio escapar em Tóquio, a nossa modalidade mais tradicional mostrou que também é parte essencial do futuro do Time Brasil. 

Luiza Moraes/COB



Enquanto o maior símbolo humano atual do poder na França viu a consagração de Bia, a glória de Ana Patrícia e Duda veio aos pés da representação mais icônica do país de forma geral. Ali na arena da Torre Eiffel, o vôlei de praia também reencontrou o seu caminho com o Olimpo depois de oito anos. Se John Lennon pede para nos imaginar um mundo sem países na música tocada no tie-break para acalmar os ânimos, é certo as canadenses Melissa e Brandie queriam imaginar ali pelo menos um mundo sem o Brasil de Ana Patrícia e Duda. Campeãs olímpicas da juventude e adultas do Mundial e do Pan, elas levaram o título que faltava para a parceria. E fizeram o Brasil poder também sorrir poucas horas depois de uma tragédia aérea sem precedentes em mais de quinze anos. 

Se o Brasil levou ouro na areia de Paris, a neve trouxe o bronze de Zion Bethonico nos Jogos da Juventude de Inverno de Gangwon, na China. Mas nenhum solo foi mais sagrado do que o da Arena de Bercy. Literalmente. Naquele solo, ganhamos não apenas a nossa filha mais gentil, mas também a mais vitoriosa. Rebeca Andrade se juntou a um panteão em que os nomes ao seu lado representam saudades para os brasileiros não apenas esportivamente. A última prova da ginástica na Olimpíada foi mágica em cada movimento. Incluindo na reverência prestada pelas americanas Simone Biles e Jordan Chiles no pódio. Na Olimpíada em que o público voltou a lotar as arenas, o mundo se juntou para aplaudir a nossa estrela. 

Foto: Daniela Porcelli/ Eurasia Sport Image



Sair de 7 para 3 ouros certamente foi um baque, mas nenhum deles pode ser visto apenas como uma engrenagem na contagem do quadro de medalhas. Assim como o futebol não foi tricampeão, Martine e Kahena também não conseguiram o feito na vela, que saiu sem manter a sua tradição. A esperada conquista em um esporte inédito, como no tênis de mesa ou no tiro com arco, igualmente ficou faltando. Mas precisamos aprender a curtir também o presente, valorizando mais as medalhas conquistadas do que as projetadas. Se o ano termina com promessas surgindo também em modalidades como o automobilismo, o surfe e até o esqui, aguardemos essas ascensões com esperança, mas sem esquecer ou minimizar quem já está tornando o hoje mais alegre. Em Paris, foram 20 momentos especiais assim. Coincidentemente, eles renderam um 20º lugar entre as nações. Aquém do nosso potencial? Certamente. Mas enquanto a preparação para Los Angeles só começa, é hora de sorrir e cantar com essas conquistas que vão nos acompanhar não apenas pelos próximos quatro anos, mas para sempre. Sonhar é necessário, mas desfrutar da realidade é essencial também. Que a magia olímpica siga nos acompanhando inclusive quando já consumada! 

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